Please ensure Javascript is enabled for purposes of Acessibilidade

O grito silencioso da lâmina entre os adolescentes tem crescido nos últimos anos e acende um alerta para os educadores. Comportamento mais comum em sujeitos adolescentes, a automutilação, também denominada de self cutting - cortando a si mesmo - consiste em cortes intencionais que o sujeito faz em sua própria pele, no intuito de ferir-se, deixando uma cicatriz no corpo (os braços são o local mais comum).

Considerando a gravidade destes fatos identificados em vários casos entre os adolescentes no âmbito escolar, a Prefeitura de Nova Andradina, através da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Esporte, em parceria com a Secretaria de Assistência Social, está realizando um ciclo de palestras direcionadas a estudantes da Rede Municipal.

A condução do tema é tarefa da sub secretária da Semcias, a psicóloga Sonia Cristina Rodrigues Amaral, que através de palestras está levando informações às escolas que possuem alunos nos anos finais do ensino fundamental da Rede Municipal de Ensino, com o objetivo de conscientiza-los sobre os graves problemas ocasionados através do bulling e da auto mutilação no universo dos adolescentes.

Conforme especialistas da Rede Municipal de Ensino, os danos psicológicos do bullying geram traumas à vida, principalmente no contexto da aprendizagem. Durante as palestras, Sônia Rodrigues colocou-se à disposição para atender eventuais casos particulares considerados mais graves, no próprio ambiente escolar.

“Os casos de automutilação tem crescido muito nos últimos anos, por inúmeras motivações, este comportamento sempre expressa uma grande dificuldade de lidar com o cotidiano ou com questões mais graves, como o Bulling. Levando informações, e ouvindo os adolescentes, estamos realizando a prevenção primária. Fazendo os encaminhamentos dos casos já identificados, prevenimos em nível secundário, e isto é fundamental”, esclarece a psicóloga Sonia Amaral.

O que é automutilação? A automutilação é uma prática de agredir o próprio corpo, que pode acontecer de diferentes formas. A mais comum é fazer pequenos cortes na pele, mas a pessoa também pode se bater, se queimar com cigarro, arrancar os cabelos, se furar com agulhas ou praticar qualquer outra autolesão. “Os ferimentos costumam ser feitos em lugares que podem ser escondidos, como braço, perna e barriga. Os adolescentes tentam escondê-los com pulseirinhas, deixam de usar shorts e passam a usar mais mangas longas”, explica Jackeline Giusti, psiquiatra assistente do ambulatório de adolescentes com problemas de automutilação, do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP).O que motiva esse comportamento?

Muito diferente do que as pessoas acham, o autor não busca a dor física pelo prazer de sentí-la. “Em sua maioria os casos de auto mutilação vem associado com a incapacidade de lidar com sentimentos aversivos, frustrações, medo, ou mesmo com uma necessidade de se auto punir por um comportamento inaceitável. A baixa autoestima e o isolamento também são características comuns nestes adolescentes. Nem sempre há transtorno psiquiátrico, mas uma tristeza, é sempre presente. Alguns casos ainda apresentam comorbidades com outras doenças associadas como Depressão, Bulimia ou anorexia”. Explica a psicóloga Sonia Amaral.

Para João Paulo Braga, doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará e autor da tese “Autolesão na Era da Informação: uma abordagem sociológica do cutting entre subculturas urbanas”, apesar dos estudos se concentrarem na área médica, é preciso considerar as razões sociais que levam ao crescimento do fenômeno. “A base do cutting está no empobrecimento das relações interpessoais das crianças logo no início da adolescência, somado a um grau de exigência muito grande, não só de estudo, mas de beleza física”, diz. Ele afirma que, apesar do aumento dos casos, a automutilação não é um modismo adolescente. “Quase todos os relatos que obtive durante os cinco anos de pesquisa apontam problemas familiares como abandono de um ou ambos os pais, rejeição e agressão pelo fato de serem homossexuais, abuso sexual, humilhações que o indivíduo sofre por parte de um dos genitores ou mesmo a vivência com pais excessivamente individualistas e ausentes”, indica. A internet pode influenciar esse comportamento?

A internet em si, não, mas o material que o adolescente tem contato nela, sim. Diferente de outras experiências comuns à idade, não existe uma pressão de grupo para se automutilar. No entanto, um jovem pode começar a fazer isso ao se identificar com alguém que já passou por uma situação análoga a dele, especialmente artistas que ele admira, ou com uma comunidade que discuta temas vivenciados por ele. Dentro de algumas subculturas jovens, por exemplo a de bandas de hardcore e punk , os assuntos tratados nas letras, como melancolia, conflito ou raiva, acabam sendo reconhecidos como os que experimenta o indivíduo que se automutila. “A música de hardcore é uma forma de extravasar e aliviar as aflições e depressões adolescentes”, explica João.

Existe um perfil de pessoas que se automutilam?

A prática costuma se iniciar no começo da adolescência, por volta dos 12 anos, e vai perdendo força à medida que o adolescente se aproxima dos 18 ou 19 anos. Apesar de ser mais frequente entre meninas, Jackeline, do Instituto de Psiquiatria da USP, alerta que a automutilação costuma ser mais agressiva entre os meninos. |Às vezes, a intenção é fazer cortes superficiais, mas pela impulsividade e força, acabam fazendo lesões mais sérias do que planejadas|, diz Jackeline.

O que fazer quando um aluno está se automutilando?

A instituição precisa estar atenta aos possíveis sinais – como blusas de frio em altas temperaturas, isolamento, sintomas de baixa auto-estima ou depressão, uma vez identificado um caso, chamar aluno e responsáveis para conversar. “Muitas vezes, os familiares acabam não percebendo isso dentro de casa, o que pode acabar agravando o quadro na medida em que o tempo passa. Muitos acham que usar roupas de mangas longas, se isolar, ou ficar deprimido é ‘coisa de adolescente’ ou ‘modinha’, mas não é”.

Na hora de conversa com o estudante que se automutila, é necessário ter uma atitude acolhedora, sem julgamentos, se mostrar disposto a ouvi-lo e tentar entender. “Às vezes, o sofrimento está associado à uma dificuldade dele na escola, como não conseguir passar de ano, e uma conversa franca pode diminuir a tensão” A atitude acolhedora também vale para os pais que, geralmente, não sabem como reagir à situação.

“Este trabalho dentro das escolas é fundamental para a conscientização a respeito de uma realidade que se tornou um problema de alta complexidade e é por isso que estamos atentos no sentido de fazer a nossa parte no contexto do ensino e aprendizagem. Para o ano seguinte estamos planejando intensificar as parcerias entre as instituições, com o objetivo de minimizar as ocorrências que vem influenciando tragicamente no aprendizado dos nossos alunos, principalmente na fase da adolescência, e consequentemente abalando as estruturas familiares”, considera o secretário de Educação, Cultura e Esporte, Fabio Zanata.